segunda-feira, 24 de julho de 2017

Desabafo de vítima do Jogo Baleia Azul emociona juiz em decisão

Menina escreveu carta à mãe se culpando e pedindo perdão

Rio - ‘Não fui forte, desculpa (...) por todas as vezes que te magoei, por todos os gritos (...)’, diz trecho de uma carta de uma jovem, de 15 anos, à mãe. Em outra parte, a menina implora. “Perdão, mas eu criei um mostro dentro de mim, um mostro sem remédio para a cura. Eu amo você!”. A carta foi encaminhada à Justiça. O desabafo da menina, que escapou da morte, é reflexo do sofrimento causado pelos desafios impostos no chamado Jogo da Baleia Azul. Na ‘brincadeira’ perigosa, ‘curadores’ seduzem e induzem crianças e adolescentes de 9 a 15 anos a cometer suicídio por meio de 50 desafios, entre eles o de mutilação do próprio corpo.

No Rio de Janeiro, a Delegacia de Repressão aos Crimes de Informática (DRCI) montou operação para combater os aliciadores. O recrutamento dos jovens é feito pela internet. Quando os pais descobrem, os filhos entram em ‘parafuso’ e passam a ter comportamento ainda mais agressivo com a proibição do acesso, por exemplo, ao Facebook. Em meio às investigações, a carta da menina foi um dos pilares da decisão do juiz da 3ª Vara Criminal, Alexandre Abrahão Dias Teixeira, para decretar a prisão temporária por 30 dias de Matheus Moura da Silva, de 23 anos.

O trabalho culminou com a Operação Aquarius, com ações no Amazonas, Pará, Rio Grande do Sul, Minas Gerais, São Paulo, Paraíba, Santa Catarina e Sergipe no início da semana passada. “A carta de uma criança à sua mãe (...) é prova concreta do quão perigosa é a reinteração dessas ações e quão necessária se faz a enérgica intervenção estatal, na sua forma mais incisiva (prisão cautelar), para fazer sanar a ingerência desses agentes nas crianças brasileiras”, escreveu o magistrado em um dos trechos de sua decisão.

Desabafo da filha à mãe é indicativo concreto das lesões psíquicas proporcionadas pelos mentores deste jogo
Juiz Alexandre Abrahão

A apuração dos casos começou em janeiro, quando as vítimas prestaram depoimento na delegacia. Investigadores se infiltraram em comunidades suspeitas e identificaram Matheus. “O desabafo da filha à própria mãe é indicativa concreto das lesões psíquicas proporcionadas pela ação dos mentores deste jogo nas família”, afirmou Abrahão ao destacar parte da carta.

A divulgação do trabalho da DRCI resultou em denúncias de outros casos que ainda estão em fase de investigação. E mais: chamou a atenção de representantes de Conselhos Tutelares. Os representantes enfrentam dilemas como saber se os relatos estão ligados a conflitos de filhos com os pais ou a participação efetiva do jovem no desafio. Existe ainda a suspeita de os aliciadores usarem as divergências familiares para fomentar ainda mais as orientações de quem está vulnerável e atraído pelas regras da Baleia Azul.

Outra preocupação é a de que como pais e professores devem lidar com os efeitos dos desafios. Na semana passada, um pai procurou a DRCI. Ele relatou que a filha chegou a se jogar do segundo andar da casa onde moram, mas sobreviveu à queda em função de fios da rede elétrica da rua. A trágica cena foi registrada em vídeo que servirá para a abertura de novo inquérito policial.

Os casos em comunidades dominadas pelo tráfico de drogas são mais difíceis de apuração. Segundo um fonte ouvida pelo DIA, os pais ficam com medo de denunciar.

Matheus Moura, 23 anos, foi preso após investigações da DRCI - Divulgação

Buscam apenas orientações para o tratamento com psicólogos dos jovens. Outra faceta da investigação, como O DIA publicou com exclusividade, é a de que os curadores estariam ligados a uma rede de pedofilia. Os investigadores sustentam que a ligação se baseia nas informações de que os curadores pedem às vítimas fotos de partes íntimas. O inquérito policial apontou suas baterias para o Facebook, que não colabora com a apuração. A Justiça determinou multa de R$ 2 milhões para a rede social.

Mãe encontrou menina desmaiada por ficar sem comer, o 15º desafio

A mãe de uma das vítimas revelou em depoimento à delegacia que a filha começou a se interessar pelos desafios da Baleia Azul porque achou “muito legal” ao receber as informações por amigo virtual, no fim do ano passado. Todas as conversas foram feitas pelo bate-papo do Facebook.

O contato da jovem foi expandido ao encontrar vários grupo em pesquisa na rede social. A mãe descobriu os efeitos do desafio na menina quando ela a encontrou desmaiada no banheiro porque ficou um dia inteiro sem comer.

Depois de constatar a participação da filha, o maior desafio foi convencê-la a ficar longe do computador. A jovem ficou tão nervosa que revelou ser capaz de cometer suicídio ao presenciar a mãe desconectar o cabo do equipamento.

Durante a participação nos desafios, a adolescente, que cumpriu pelo menos 15, não poupou o corpo. Mutilou perna e braço usando gilete ao obedecer ordens como “se machuque para castigar”. O último desafio seria o suicídio pulando de uma caixa d’água.

Para conter os impulsos da filha, a mãe foi obrigada a chamar ambulância para atendimento em hospital. A jovem também conta com acompanhamento psiquiátrico para superar os reflexos do jogo.

Polícia fecha o cerco contra os aliciadores de jovens
Quatro pessoas suspeitas de atuar como curadoras do desafio Baleia Azul foram presas semana passada. Além delas, um adolescente acusado de participação no grupo de aliciadores acabou detido.

O pedreiro Matheus Moura da Silva, de 23 anos, foi o primeiro suspeito de integrar o grupo a ser levado para a delegacia. Ele foi preso por agentes da DRCI terça-feira, em sua casa, em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense. Em depoimento, o acusado afirmou que mantinha contato com outros cinco aliciadores e que já tinha feito pelo menos 30 vítimas.
No dia seguinte à Operação Aquarius, a polícia prendeu Letícia Camuci Evaristo, Rodrigo Herllan Lima Souza e Emily Eduarda Cava Leite. O inquérito da DRCI foi aberto no início do ano, e os investigadores não descartam a possibilidade de pedir a prisão de outros acusados do crime.

Cinco dicas aos pais

1 OBSERVE se o jovem apresenta alterações de comportamento, como rebeldia, tristeza, agressividade, insônia, isolamento, falta de interesse em sair de casa ou praticar atividades com os amigos. Também é importante que se repare se o adolescente trocou vestimentas leves, como bermudas e camisetas, por roupas mais longas. Em muitos casos, as vítimas se vestem com roupas compridas para esconder ferimentos pelo corpo.

2 AO PERCEBER MUDANÇAS, os pais devem se aproximar dos filhos de forma calma e amorosa, dando ao jovem a oportunidade de explicar o que está acontecendo. É importante que os pais evitem fazer críticas ou emitir julgamentos de imediato sobre os desafios. Assim, a comunicação é mantida.

3 APÓS OUVIR O RELATO do jovem, é preciso detectar o estágio do problema. Caso o adolescente esteja envolvido, descubra em qual tarefa ele está para que, juntos, possam resolver a questão. Curadores pedem para o adolescente assistirem filmes de terror.

4 Não deixe de procurar um profissional habilitado: psicólogo ou psiquiatra. É importante manter sigilo para o jovem não se sentir constrangido. Qualquer alarde pode atrapalhar o tratamento. 

5 O PROFISSIONAL verifica se o jovem necessita de algum tratamento, seja a terapia isolada ou associada ao uso de medicamentos. Caso o jovem esteja de fato participando, os pais devem comunicar à polícia. Dentro de casa, não deixe o jovem ficar trancado em algum cômodo.


por Adriana Cruz e Jonhatan Ferreira
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